A origem da Igreja Católica
Apostólica Romana
O INÍCIO DO CATOLICISMO E A CONSOLIDAÇÃO DO PODER PAPAL
por Josimar Tais
“Nenhuma história diz tanto sobre os últimos 2000 anos deste planeta quanto a da Igreja. Pelos corredores do Vaticano passaram reis, guerras, o melhor da arte e até alguns santos.” (BOTELHO, 2007, p. 59). Mas como toda essa história começou?
Para a Igreja Católica, a passagem bíblica de Mateus capítulo 16, versículo 18, revela a escolha do sucessor de Cristo na Terra. Esse representante seria encarregado de divulgar os ensinamentos que o próprio Cristo havia pregado e teria a missão de converter os pagãos ao Cristianismo, ou seja, o simples pescador Pedro, agora incumbido de ser um pescador de almas, se tornara o primeiro papa da então “fundada” Igreja Católica Apostólica Romana.
O termo “católica” tem uma explicação. Segundo Botelho:
O patriarca de Constantinopla, atual Istambul, considerava-se tão importante quanto seu colega italiano. E ainda havia discordâncias em certos aspectos da liturgia romana, como o celibato e a missa em latim. A rixa explodiu em 1054, quando o papa Leão 9º e o patriarca Cerulário excomungaram um ao outro e romperam relações. Os orientais formaram a Igreja Ortodoxa, enquanto a Igreja Romana se declarou a única, eterna e católica, - do grego katholikos, “universal”. (BOTELHO, 2007, p. 63).
Segundo dados do Almanaque Abril 2007, o Cristianismo conta com 2,135 bilhões de adeptos no mundo, sendo que desse total, 1,1 bilhão são católicos. Dessa maneira, a religião cristã é a maior do mundo. No entanto, sabe-se que o Cristianismo ramifica-se em diversas denominações, que são basicamente o Catolicismo, Ortodoxismo e Protestantismo. Essa divisão do Cristianismo é decorrente do modo diferenciado que os povos e culturas têm de interpretar as Sagradas Escrituras. Certamente, criar essas divergências não foi a intenção de Jesus.
Mas afinal, os ensinamentos que Cristo transmitiu para o povo de seu tempo são dogmas religiosos ou não passam de pensamentos e reflexões filosóficas para que as pessoas pudessem se autoanalisar e encontrar dentro de si uma alternativa de vida que fosse mais otimista, serena e altruísta? De que forma pode-se definir este homem que dividiu a História: líder persuasivo? O messias tão aguardado pelos semitas? Um grande filósofo? Um fanático religioso? Um oportunista? Ou apenas como um ser humano que soube enxergar no mundo a plenitude da vida e da natureza e apropriar-se disso? A resposta é bem relativa à crença de cada um, no entanto, analisando-se alguns de seus sermões, fica evidente que Cristo sabia fazer bom uso da sua mente e da oratória, combatendo tudo aquilo que pudesse desvirtuar a paz do ser humano, seja interna ou externa.
Para os cristãos de modo geral, seu líder, Jesus Cristo, foi a personificação de Deus na Terra. Especificamente para os católicos, Cristo criou a religião Católica ao indicar Pedro como seu sucessor. Mas com base em quê os católicos admitem que o Catolicismo seja a verdadeira religião cristã?
Em 2007, o Vaticano publicou um documento bastante prepotente no qual afirmou que a Igreja de Roma realmente é, sempre foi e sempre vai ser a única de Cristo:
Cristo constituiu sobre a terra uma única Igreja e instituiu-a como grupo visível e comunidade espiritual, que desde a sua origem e no curso da história sempre existe e existirá. [...] Esta Igreja, como sociedade constituída e organizada neste mundo, subsiste na Igreja Católica, governada pelo sucessor de Pedro e pelos bispos em comunhão com ele. (VATICANO, 2010).
Diante do exposto, o versículo 18 de Mateus 16 não teria sido talvez, interpretado de maneira radical em favorecimento de um grupo para justificar uma nova fé ainda minoritária em meio à outra já consolidada? Conforme Botelho, “o cristianismo era uma seita de judeus para judeus. [...] A ideia de que Jesus era o tão aguardado Messias, porém, não pegou entre todos os judeus” (2007, p. 60). Esse fato explica a dispersão dos apóstolos para outras regiões do mundo até que se chegasse a Roma, o centro administrativo do então inabalável Império. Embora muitos especialistas contestem, “a tradição católica assegura que Pedro viajou a Roma por volta do ano 42”, diz Botelho, que complementa:
Os cristãos eram perseguidos por se recusar a adorar os deuses romanos. O próprio Pedro foi preso e levado ao Circo de Nero, uma arena usada para corridas de carruagens e execuções de traidores construída num terreno pantanoso nos subúrbios de Roma. A região era conhecida como Vaticanus, provável derivação de Vaticus, antiga aldeia etrusca que existia lá. Nesse lugar misterioso e algo sinistro, Pedro foi crucificado e enterrado. (op. cit.).
Pedro, assim como o apóstolo Paulo, foi morto por ser cristão, no entanto, o Cristianismo não morreu junto com eles, pois muitas pessoas já tinham ouvido a mensagem de Cristo. Os grandes líderes da Igreja Católica afirmam que a Basílica de São Pedro, em Roma, foi construída sobre a sepultura do fiel discípulo de Jesus, porém, há os que contestam. “Havia cemitérios no Vaticano muito antes de Cristo. O túmulo na basílica talvez nem seja cristão – os romanos pagãos costumavam usar símbolos de todas as religiões” (Chevitarese apud.BOTELHO, 2007, p. 60). Chevitarese explica também que duvida da liderança absoluta de Pedro, pois, segundo ele, o Cristianismo antigo não tinha hierarquia rígida, isso só teria acontecido quando Constantino se converteu ao Cristianismo. Além do mais, os imperadores passaram a fazer doações, o que foi enriquecendo a instituição e então se criou o celibato para impedir que a fortuna fosse dividida entre herdeiros. Chevitarese conta ainda que o poder logo subiu à cabeça dos bispos romanos que, no fim do século IV adotaram o título de papa, “pai” em grego, sinal de que se consideravam chefes dos outros. (op. cit.).
Sabe-se que o papa representa a autoridade máxima dentro do clero e da doutrina católica, e que abaixo dele existem demais cargos, perfazendo-se assim uma grossa hierarquia eclesiástica. Quando um papa morre, outro deve ser escolhido para assumir o seu posto. Quem então ocupou o lugar de Pedro se não existia hierarquia nos primórdios do cristianismo? Segundo Botelho, Pedro, precavido que era, já havia escolhido um sucessor, Lino, romano convertido ao cristianismo sobre o qual, diz Botelho que nada se sabe além do nome. Parece contraditório, mas Pedro já tinha um sucessor. “E assim a autoridade de Pedro foi transmitida, como continuaria sendo de geração em geração e de bispo em bispo, até chegar a Bento 16, o 267º herdeiro de São Pedro – ou 265º, como prefere a Igreja, que riscou de sua lista Estêvão, que morreu apenas 3 dias após ser eleito, e Cristóvão, que tomou o poder à força”. (BOTELHO, 2007, p. 60).
Papa Francisco |
No decorrer de sua história, a Igreja Católica foi conquistando autoridade, respeito, terras e fiéis, tendo seu auge durante a Idade Média. Porém, esse poder todo é questionável, pois nem sempre ele foi adquirido somente pela expansão da fé, mas sim através de fraudes. Prova disso é a polêmica que envolveu papas medievais e o nome do imperador romano Constantino. A polêmica veio à tona no final da Idade Média e atende pelo título de “Doação de Constantino”. Segundo Botelho (2007, p. 63), “o texto conta como o imperador foi milagrosamente curado da lepra graças às preces do papa Silvestre. Em troca, transformou os papas em seus herdeiros legais: ‘a eles deixo a coroa imperial e o governo de todas as regiões do Ocidente, de agora para sempre”.
Tendo, portanto, como respaldo esse documento, os papas engrandeceram sua autoridade enquanto chefes religiosos e até mesmo como líderes políticos diante dos povos bárbaros que invadiram e puseram fim ao Império e sobre os demais membros já pertencentes a ele.
Embora a Doação de Constantino tenha sido aceita por muitos anos durante a Idade medieval, o documento na verdade não havia sido elaborado e muito menos assinado pelo Imperador Constantino. Conforme Botelho explica:
Muitos historiadores acreditam que a fraude foi usada pela primeira vez em 754 [Constantino havia morrido em 337]. Nesse ano, Estêvão 2º viajou para encontrar Pepino, rei dos francos. Estêvão procurava ajuda para transformar Roma e as terras vizinhas em território da Igreja. Pepino, que havia tomado o trono à força, tentava legitimar seu poder. (op. cit).
“A Doação foi apresentada pessoalmente por Estêvão a Pepino. O rei franco aceitou o documento como prova de autoridade dos papas”, afirma o historiador Norman Cantor (apud. Botelho, 2007, p. 63). Depois de ter a coroa consagrada por Estêvão, Pepino partiu para a Itália. Expulsou os lombardos, que dominavam o país na época, e converteu um pedaço da Itália central em território independente, da Igreja, conta Botelho que complementa dizendo que o coração do novo reino era a cidade de Roma e a área vizinha, que hoje forma o Vaticano. Todos os habitantes dessas regiões viraram súditos dos papas, passaram a lhes pagar impostos, a ser julgados e governados por eles. Assim nasceu o Estado Pontifício, que durou até 1870 (op. cit.).
“Contudo, o peso desse documento acabou sendo desmascarado no século XV, quando o estudioso Lorenzo Valla apresentou uma série de documentos que comprovaria a falsidade do tempo em que o documento da doação teria sido feita” (A DOAÇÃO DE CONSTANTINO, 2010). Valla detectou erros linguísticos, históricos e geográficos que possibilitaram desvendar a fraude da Igreja.
De modo geral, percebe-se que a história da Igreja Católica é fundamentada em confusões, perseguições, interesses mal intencionados e fraudes. A mais antiga, ou pelo menos uma das mais antigas organizações do mundo encerrou guerras e trouxe a paz, mas o inverso também é verdadeiro, o que a torna notável, percebida pelas polêmicas que causa, conhecida como santa e, paradoxalmente, pecadora Igreja Católica Apostólica Romana.
REFERÊNCIAS:
A DOAÇÃO DE CONSTANTINO. Disponível em:
<http://www.historiadomundo.com.br/idade-antiga/a-doacao-de-constantino.htm>. Acesso em 09 nov. 2010.
ALMANAQUE Abril. Ranking das Religiões. Disponível em: . Acesso em 21 ago 2010.
BÍBLIA, N.T. Mateus. Português. Bíblia Sagrada. Trad. Almeida Revista e Atualizada. 2 ed. São Paulo: Sociedade Bíblica do Brasil, 1993. Cap 16, vers. 18.
BOTELHO, José Francisco. Vaticano uma biografia não autorizada.Superinteressante, São Paulo, n 239, p. 58 – 67, mai. 2007.
VATICANO define Igreja Católica como 'única de Cristo'. Disponível em: . Acesso em 21 ago 2010.
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- Símbolos da religião;
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